Quando criança, eu às vezes ouvia
pessoas dizerem: “Se houvesse uma guerra, dava jeito em muita coisa
neste país!”
Eu ficava imaginando como uma guerra
poderia melhorar alguma coisa...
A guerra só pode ser definida como uma
coisa a ser evitada. Ela faz tanto mal a tanta gente, de forma
injusta e inevitável, que dificilmente compensa envolver-se em uma.
Geralmente, isto só ocorre quando
aceitar passivamente uma situação pode significar um destino pior
que a morte para uma coletividade. Lutar para não ser escravizado é
uma das situações aceitas universalmente como justificativa para
uma guerra.
Mas, para cada cultura, as
justificativas variam em importância relativa, de acordo com os
valores locais. Houve guerras que começaram supostamente em
decorrência de acontecimentos pontuais, embora tais eventos tenham
sido o efeito gota d'água, transbordando um cálice já lotado até
a boca.
Já houve um conflito entre duas nações
centroamericanas por causa de...um jogo de futebol! Na chamada Guerra
do Futebol ou Guerra das 100 horas, em 1969, El Salvador e Honduras
combateram durante 4 dias num conflito que começou por causa de
hostilidades entre torcedores, numa série de 3 jogos que decidiriam
uma vaga para a copa de 1970!
(El Salvador venceu o jogo decisivo, realizado no México, e se classificou.)
Finalmente, houve a intervenção da
Organização dos Estados Americanos, que intermediou um cessar-fogo!
Os EUA se envolveram na Guerra do
Vietnam em função dum incidente envolvendo um suposto ataque de
barcos-patrulha do Vietnam do Norte contra um contratorpedeiro
americano. Acontece que, anos depois, não se conseguiu encontrar uma
só testemunha deste incidente, negado até pelo comandante do navio
americano!
Entretanto, a guerra, em algumas
nações, parece ter um efeito de amadurecimento, fazendo com que a
população faça uma reordenação de valores e prioridades dentro de uma ordem mais realista, se conscientizando da
verdadeira importância de cada coisa, no contexto geral.
Recentemente, um órgão de impressa de
um país da Europa, criticando a realização da copa do mundo no
Brasil, país cheio de problemas básicos a serem resolvidos, teria
declarado que a maioria dos brasileiros se preocupa mais com futebol,
espetáculos e festas como o carnaval do que com as eleições, a
política, a economia, a saúde e a educação do seu país.
(Eu realmente prefiro mais assistir a um
jogo de futebol do que a um debate político.)
Uma vez, enquanto eu assistia a um jogo de futebol na TV, uma pessoa comentou que odiava o futebol (e esportes em geral), e disse que isso era “coisa de país atrasado”.
Uma vez, enquanto eu assistia a um jogo de futebol na TV, uma pessoa comentou que odiava o futebol (e esportes em geral), e disse que isso era “coisa de país atrasado”.
Eu lhe respondi que então devia ir
para um país onde as pessoas não dessem tanta importância aos
esportes, e onde, ao invés de jogar ou assistir a
futebol, se fazia guerrilha, explodiam carros e homens-bomba ou
apedrejavam, chicoteavam e até baleavam mulheres que queriam
estudar!
Falei isto num momento de irritação,
mas gostar de esportes não é “coisa de país atrasado”!
Construir estádios modernos e confortáveis é aceitável, em países onde as primeiras necessidades da população já foram atendidas...
Agora, “coisa de país atrasado” é
gastar dinheiro público em estádios e instalações de
apoio para sediar uma copa do mundo, que será a mais
cara da história, com gastos que podem alcançar 30 bilhões de reais,
segundo o site R7 ESPORTES, em um país onde não se investe
com seriedade na educação, onde a saúde pública é um terror, e
onde a segunda maior cidade do país vive uma guerra civil, com áreas
onde nem a polícia pode passar com segurança.
Cena usual no corredor de um hospital público brasileiro. Estes tiveram sorte, pois diversos pacientes ficam lá fora...
E aí, os críticos de além-mar acabam
tendo razão, embora seja difícil para um brasileiro engolir!
Difícil obter bom rendimento dos alunos, com salas de aula sem nenhum conforto, sem transporte escolar e com greves de professores todos os anos, prejudicando o ensino...
Muito tem sido lembrada a figura do
imperador romano Vespasiano, que iniciou a construção do coliseu de
Roma, assumidamente para manter a política do “pão e circo”,
dando ao povo o essencial para a subsistência e mais a diversão, para
garantir o apoio das massas populares.
Da mesma forma, quem já deu aos pobres
as esmolas do assistencialismo, proporciona também o circo da copa
do mundo, num ano de eleições, que sem dúvida, serão
influenciadas pelo sucesso (ou fracasso) da equipe brasileira na
competição.
Será mesmo preciso uma guerra para que as
pessoas deste país aprendam a colocar as coisas no seu devido lugar?